segunda-feira, agosto 21, 2006

O poder compartilhado no ponto-de-venda

Simonetti, Sérgio Ricardo
Consultor e professor da FGV nas áreas de Vendas, Marketing e Trade Marketing, consultor associado da Glendinning International Management Consultants-UK e diretor de Novos Negócios da Plano.Trio Comunicação.


No início do século passado, Henry Ford apresentou ao mundo um modelo de gestão impensável a época, que se baseava na produção industrial em série, onde a massificação era a grande tônica. Com o pensamento antológico baseado na idéia de que "o consumidor pode escolher um Ford de qualquer cor, desde que seja preto", posicionava-se claramente para o mundo quem tinha o poder do mercado nas mãos: a poderosa indústria.

Na década de 70, com a intensificação do comércio mundial e o fortalecimento da classe média de alguns países, o crescimento do consumo veio acompanhado de uma maior exigência pela qualidade e entrega do prometido pelos produtos.
Um desespero bate às portas da indústria, que agora se vê pressionada a implementar programas de garantia de qualidade, fortalecer as áreas de P&D para trazer novas soluções e variedades, além de outros projetos que trouxessem respostas rápidas ao mercado. O bastão do poder estava, então, democratizado agora nas mãos dos consumidores.

Parecia ser um justo e lógico fim. Mas não. Ninguém contava que um silencioso movimento de concentração e fortalecimento das grandes redes de varejos, particularmente na Europa e América, disparasse uma disputa expansionista entre esses grupos pelo mundo, de modo a por em cheque a posição dos consumidores. Mas foi o que ocorreu, e esses grupos passaram a ditar as tendências e até o gosto ao consumidor, além de arranhar todo o esforço feito na construção de marcas.

E agora, vamos parar por ai?
Movimentos detectados indicam que não. Depois de passar pela indústria, pelo consumidor e chegar ao trade (intermediário), o poder sobre o mercado já não é mais unânime, ao menos por três pontos:

1) O expansionismo dessas grandes redes de varejo trouxe uma competição predatória entre elas pela conquista do consumidor, impactando seus próprios resultados.

2) Os consumidores começaram a demonstrar sua insatisfação a essas imposições das redes globalizadas e começaram a prestar também atenção em outros canais, como lojas de conveniências, de vizinhança e especializadas.

3) Os fabricantes, por sua vez, chegaram a seus limites de concessão para o trade e começam a buscar outros canais de distribuição para melhorar seu mix de margem.

Enfim, parece ser chegada a hora de se restabelecer o equilíbrio e a paz entre os três interessados e isso passa pela integração das partes. Os donos do poder no momento começam a entender que não poderão mais viver esse clima de "dormindo com o inimigo" que vivem com seus fornecedores ou um "efeito cinderela", onde sentem ser a única desejada do salão e, por isso, merecedoras de uma relação onde as indústrias entregam até 40% de seu faturamento de volta a eles. Não se iludam. Esse custo está embutido em algum lugar e/ou está sendo repassado a alguém.

O caminho para rompermos essa nova fronteira atende pelo nome de "Gerenciamento de Categoria". Gestado durante a década passada, toma força aqui no Brasil com a maior abertura das grandes redes de varejo para se debater o reencontro com melhores rentabilidades, agora em conjunto com os fabricantes, além de buscarem um meio de ser mais atrativos aos consumidores.

Uma nova visão "holística" está pairando sobre o mercado. Para termos uma relação mais saudável, precisamos pensar em como aumentarmos o tamanho da "pizza" do mercado, e não dividirmos ainda mais a pizza que dispomos. Temos, então, um acordo que precisamos entender melhor e que tem alguns pontos, até então, negligenciados, como: o comportamento do consumidor, a forma de decisão do comprador dos produtos na prateleira, a dinâmica geral do PDV, como exploramos melhor o limitado espaço das lojas, e por aí vai.

Com um melhor mix de produtos no estoque e na prateleira, melhores promoções para atrair e fidelizar consumidores, preços bem posicionados e uma comunicação do produto que facilite a decisão do comprador na prateleira, parecemos ter o melhor equilíbrio entre todas as partes interessadas e, felizmente, caminhamos para abandonarmos os tempos do domínio absoluto de um único ditador das tendências no mercado.
Vamos ver até quando, pois, "o poder é efêmero e embriaga".

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