segunda-feira, agosto 28, 2006

NÃ-NÃ-NÃ, DA-DA-DA...


J. Roberto Whitaker Penteado
É um dos mais conhecidos e respeitados profissionais de marketing do Brasil. É membro do Conselho Superior da ESPM - instituição à qual está ligado há mais de três décadas. Atualmente, é Diretor do Instituto Cultural da ESPM, em São Paulo.

As peças vão-se encaixando, aos poucos. Na primeira vez em que vi – e não gostei – a moça da TV fazer um gesto com a mão significando “faz um vinte-e-um” veio-me a reflexão: gostar ou não gostar, pessoalmente, nunca foi nem será o critério para avaliar uma campanha de comunicação. Era claro que a campanha tinha o mérito de ter criado um bordão, como se diz, que se podia adaptar a uma variedade de suportes, desde um comercial de TV de 15 segundos, até um outdoor, cartazete de ponto de venda ou anúncio impresso.

Depois vieram outras: a do nã-nã-nã, da cerveja, mãe ou tia torta desta execrável da-da-da do refrigerante, o gestual da dor-de-cotovelo, dos automóveis – e, por que não, o ÃO do Estadão?... Então li uma palestra, feita em Cannes, por Lord Maurice Saatchi, propondo que a nova fórmula da propaganda moderna seja: quanto menos palavras, maior a possibilidade de a estratégia ser eficaz. Literalmente: a posse de uma palavra é o ativo de maior valor na era digital.

É bem verdade que, nessa palestra, Lord Saatchi não conseguiu dar um só exemplo de campanha de sucesso baseada em uma única palavra. Mas acentuou, sem dúvida, o conceito de que o caminho do sucesso, na nova propaganda, passa pela descoberta de um ingrediente único, singular, que se possa associar positivamente à marca de um produto ou serviço. Estará aí, talvez, o germe da grande insatisfação que sentimos diante da propaganda atual?

A minha geração começou a trabalhar em propaganda em cima do que se chamava “copy”. O texto dos anúncios impressos – e, algumas vezes, as suas ilustrações – determinavam a qualidade da percepção dos consumidores. “Se é Bayer é bom”, “É melhor e não faz mal” – e depois - “Isso é que é”, para Coca Cola. “Pense pequeno”, para o Fusca. A chegada da TV trouxe um formato novo e generoso (embora não o considerássemos assim, na época) no comercial de 30 segundos: palavras, imagens com cores e movimento, trilha sonora e pack-shots, para encerrar.

Reputações foram construídas – nesses limites – tanto para os produtos anunciados como para os profissionais que, em duplas de criação, bolavam as mensagens. A bonança durou quase meio século. Quase todas as grandes campanhas das últimas décadas, em especial até os anos 90, desenvolveram-se a partir de um memorável comercial de 30 segundos. E agora? A evolução da tecnologia resultou numa multiplicidade de suportes para a transmissão de idéias – e em novos hábitos das pessoas, em relação à mídia, que trouxe sérias dissonâncias ao próprio processo de percepção.

Diante da tradicional tarefa de transformar estratégias em símbolos, os publicitários estão ficando, literalmente, sem palavras. Não é um problema de fácil solução. Na verdade, encontrar o caminho tornou-se, para a nova propaganda, uma estratégia para a própria sobrevivência. Pode-se até aceitar que nã-nã-nã e da-da-da sejam precursores de alguma coisa. Mas corre-se o risco de que – de bordão em bordão, de grunhido em grunhido - em vez de evoluir, a propaganda reverta à idade da pedra.

Nenhum comentário: